terça-feira, 4 de setembro de 2007

História de Lourenço Marques (O INÍCIO) Cap.II


CAPÍTULO II

FORTE DE S. JOSÈ – INTERMEZZO AUSTRÌACO ( 1730 - 1781)

O que resultou da primeira tentativa do então poderoso Império Austríaco no sentido de fundar uma colônia sua em África, transforma este período como um dos mais graves para a presença portuguesa em Lourenço Marques.

A escolha do local recairia precisamente na baía de Lourenço Marques, que os holandeses haviam precipitadamente abandonado em 1730

Trata-se de um agitado período de lutas e de intrigas, de audácia e de sutileza na conquista dos mercados do Oriente, vivido no esplendor da corte da Grande Maria Teresa de Habsburgo e da restauração Pombalina.

Para que possamos entender melhor este período agitado da ocupação Austríaca da baía de Lourenço Marques no ultimo quartel do século XVIII, temos de lembrar de William Bolts.

Nascido em Amsterdão, em 1740, filho de pais Alemães, emigrou com seus parentes para Portugal, exatamente Lisboa, e trabalhava em 1755 ( ano do pavoroso terremoto) em uma firma Inglesa como caixeiro. Embarca em 1759 para Malabar, quando entrou ao serviço da “British East Índia Company”.Já havido sido transferido para um posto superior e em 1767 era o encarregado de cargas em Bengala.

Neste mesmo ano, aplicou os seus créditos a favor do Pavilhão Português e onde fez carregar em Calcutá “pela primeira vez” um navio português, vindo da Europa, chamado “Santiago Maior”, com uma carga de 400 000 florins de mercadoria para Lisboa.

No Ano de 1769 fez “igualmente passar outro carregamento de 800 000 florins sob o Pavilhão português ”,a bordo da nau “Ajuda”, que teria levado de bengala a Lisboa um tal de Louis Cantofer, como seu agente.

Por intermédio desse Cantofer, teria Bolts feito chegar ás mãos do Marquês de Pombal um plano para desenvolver o comércio de Portugal com a Ásia.

Segundo Bolts, foram estes seus planos, os carregamentos que fez e as informações que prestou, que serviram de base “à restauração do comércio de Portugal com as Índias Orientais.

Entretanto Bolts caiu no desagrado do governador Inglês e da própria “East Índia Company”,forçado a embarcar para a Inglaterra,tendo a companhia confiscado-lhe os bens que possuía.Uma vez em Londres, entrou em choque com a poderosa Companhia, cujos segredos bem conhecia e contra a qual escreveu um livro célebre intitulado “Considerations on Índia Affairs”, contendo acusações gravíssimas que provocaram grande escândalo,por descrições das arbitrariedades sobre a produção, salários que cada operário recebia pelo produto de seu labor, e das transferências de um patrão para outro ,como escravos. Bolts denuncia deste modo que o chamado “Comércio inglês com Bengala , não era mais do que um roubo organizado. Acredita-se que o livro de Bolts tivesse tido influência na lei que foi promulgada pelo Parlamento no ano de 1772, reorganizando toda a estrutira da “East Índia Company”.

Vendo Bolts que mais nada tinha a esperar na Inglaterra, nesse mesmo ano, apresentou ao diplomata Português em Londres,Martinho de Melo e Castro um plano que concebera para a expansão do coméricio marítimo de Portugal com o Oriente. Tentou varias vezes, e em 1774 não conseguindo impor seus ideais nem as suas pretenções teria passado a Viena, desiludido.

Favorecido pela corte de Viena, Bolts expõe á “ Osttindische Compagnie” o seu audacioso plano de comércio entre os portos de Trieste, Fiume, Pérsia, Índia e China.

Em 6 de junho de 1775 o Príncipe Wengel Anton Von Kaunitz-Rietburg, estadista, comunica ao Duque Carlos de Lorena, o plano de Bolts, advertindo-o contudo que o assunto exigia o maior segredo, principalmente no que tocava a Imperatriz Maria Teresa, uma vez que ela estava ligada á família Real Portuguesa, como sobrinha que era da Rainha D.Maria Ana, esposa de D.João V.

Estava-se na Època Doirada dessa extraordinária mulher que foi Maria Teresa de Áustria, cuja personalidade há que debruçarmo-nos para termos uma ambiência própria do “intermezzo Austríaco em Lourenço Marques.

A baia de Lourenço Marques se encontrava inteiramente abandonada havia muitos anos:

O general Teixeira Botelho (*1) em seu livro descreve este período:

“—O governador Melo e Castro, respondendo em 1753, á ordem que lhe fora dada pela corte, para restabelecer a fortaleza e a feitoria de Lourenço Marques, afirmou que nada sabia daquele porto senão por TRADIÇÂO, pois que havia muitos anos tinham deixado de navegar por ali Portugueses: mas resolvendo-se a expedir um hiate de Moçambique para o dito porto em 1755, soube que iam comerciar áquela baía e rios embarcações Britânicas, sem contudo haver feitoria dessa ou de alguma outra nação nas suas margens.

Em 1763 foi uma fragata de guerra portuguesa reconhecer de novo a baía de Lourenço Marques, porém seu comandante, o tenente-coronel António José de Melo, em vez de expulsar do porto os dois navios Ingleses que lá encontrou, travou grande intimidade com seus capitães, e deixou-os em paz.

No ano seguinte,1764,veio da baía de Todos os Santos o negociante Domingos Rosa, expressamente para o comércio de Lourenço Marques, desistindo da sua continuação, em 1768, por causa dos Ingleses, que se haviam estabelecido em terra a esse tempo, arvorando a sua bandeira sobre uma tosca paliçada naquela parte do território Português. Essa ocupação , porém, foi passageira.

A baía de Lourenço Marques escontrava-se, de facto,votada pelos Portugueses a descuidado abandono.O Cônego Alcântara Guerreiro (*2),afirma que as culpas do abandono a que se viu votada a Baía de Lourenço Marques nesses anos de 1768 a 1779 caben inteiramente ao Governo Central, então dirigido pelo Marquês de Pombal.

Em 1776, William Bolts é investido por Maria Teresa no cargo de comandante da primeira expedição austráca ao Oriente, para exercer autoridade sobre soldados e marinheiros que seguiriam sob suas ordens, a bordo do navio “Joseph et Therese” ( antigo The earl of Lincoln que era da East Ìndia Company).

Perante a situação, o esgotamento da França com a guerra contra a Iinglaterra, á Áustria convinha muito entrar em relações comerciais com o Oriente, mas acontecia que iria colidir precisamente com a política de ressurgimento naval de Portugal, iniciada por Martinho de melo, ressurgimento esse intensificado quando o ministro teve movimentos mais livres com a queda de Pombal.

Bolts deve ter partido de Londres com o “Joseph et Thereze” em Março de 1776 com destino a Lisboa.Recrutou em Londres a tripulação necessária e é de se supor que ao zarpar da capital Britânica levava a bandeira Inglesa.

A Tripulação revoltou-se quando o pavilhão Inglês foi substituído pelo Austríaco, naturalmente no alto mar,e em Lisboa a questão só se solucionou com a intervenção de tropas Portuguesas a bordo.

A 3 de Julho desse ano, o “Joseph et thereze” , parte de Lisboa para o Mediterrâneo e a 17 desse mês está em Livorno(Itália).Isto explica a razão que iremos encontrar, depois, na tripulação de Boltz, um punhado de Portugueses, que ele teria recrutado em Lisboa em sua arribada.

Em 24 de Setembro parte de Livorno para o oriente

A bordo , um Português, natural de Moçambique, provavelmente misto, conhecendo a língua da terra e , por isso, servindo aos Austríacos de intérprete.

A bordo, 155 homens e algumas mulheres, entre as quais se encontrava a de Boltz. o Navio rumou á Madeira,onde carregou o navio de vinho como ainda obteve pés de videira que mais tarde plantaria em Lourenço Marques. A 11 de novembro de 1777 ruma para o Rio de Janeiro,onde inicialmente lhe foi recusada a entrada no porto por carregar o pavilhão Austríaco e após três dias de conversação lhe é facultada a entrada para tomar aguada. Aqui se abasteceu de sementes de abóbora, de melancia e de inhames ( que em Lourenço Marques iria encontrar em grande abundância, mas isto era a prova que preparava-se para efetivamente para a fixação. Ainda de sementes de ananás, pois há menção de as haver semeado “Trazidas da América”

Nicolau Fontana, o médico de bordo, (*3)escreve detalhes da viagem:

“—Em 2 de janeiro ( 1777 ) partimos desta parte do Mundo (Rio de Janeiro) com destino ao Cabo da Boa Esperança, que contornamos a 28 de fevereiro.No dia 2 de Fevereiro descobrimos e exploramos as ilhas de Tristão da Cunha. Estão situadas na latitude 38,7 e aproximadamente a 33 graus ao largo do Cabo da Boa Esperança. Devido a constantes temporais tivemos que deixar essas ilhas no mesmo dia com o propósito de as explorarmos minuciosamente mais tarde.

Entre Natal e Sofala, Costa Oriental de África acima, a 25 Graus e 28 Minutos de latitude, existe uma baía de 18 milhas de comprimento e é conhecida pelo nome do seu descobridor, Lourenço Marques ( Laurent Márquez). Nessa baía existe um estuário de três rios conhecidos pelos nomes dos reinos por si banhados.

O do meio chama-se MAHUMO e é conhecido na cartografia pelo nome de “Rio do Espírito Santo”. A entrada na baía só é possível a navios de pequeno calado.

A parte Oeste da baía que é conhecida pelos nativos pelo nome de TEMBE, é muito baixa, lamacenta e tem á beira mato virgem e na vizinhança alguns pântanos, os quais quando a maré é baixa enchem o ar de odores insalubres e pùtridos, e de nuvens imensas de insectos que incomodam.

A parte oposta está situada em terreno mais alto e tem solo seco e arenoso. As palhotas dos habitantes estão afastadas do rio. À medida que íamos subindo o rio muitos dos nossos tripulantes adoeceram Não foi possível obter o necessário alimento para a tripulação.Más colheitas que os naturais haviam experimentado há pouco tempo tornaram impossível obter deles gêneros frescos.

Na opinião de Nicolau,enquanto o denso arvoredo, que cobre as margens lodosas do rio, não for cortado , a atmosfera será sempre prejudial aos seus habitantes..

A vegetação apodrecida que é coberta pelas folhas caídas das árvores, e o Pãntano sem qualquer viração de ar fresco tornarão sempre esta região insalubre e mortífera.assim como , quanto ao Tifo, a situação do local permite a sua proliferação. Ele será sempre um foco de doenças.

Resolveram então estabelecer as casas dos colonos numa das ilhas da baía, próximo ao estuário e da terra firme, onde a elevação do terreno, o cultivo da terra e a brisa fresca e seca torna a vida agradável.

Bolts encontrou na baía várias embarcações ocupadas no trato de comércio e arvorando pavilhão Inglês. Estabelecidas as relações com os comandantes Burton, Mckenny e Cahill,aproximou-se dos régulos a quem chama MOHAAR CAPELE, do TEMBE e CHIBAZAAN MATOLA,e com eles celebrou tratados, que depois seriam contestados por Portugal.

Para protecção de sua feitoria, Bolts construiu então do lado da atual cidade de Lourenço Marques uma fortificação que mais não foi que um “campo entrincheirado”

Esta fortificação se manteve até 1781 ,quando da chegada da expedição vinda de Goa, em Março de 1781, sob o comando do tenente-coronel Joaquim Vicente Godinho de Mira com a embarcação “Sant’Anna”.

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